segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Memorial

Meu contato com as histórias começou bem cedo. Quase todas as noites, principalmente naquelas em que ficávamos sem energia elétrica, mamãe e papai reuniam seus cinco filhos na sala e contavam histórias para nós. Ele se encarregava das piadas e ela das histórias infantis, lendas e contos fantásticos.
Quando via meus irmãos indo para a escola, insistia com minha mãe que tinha de estudar, porque não queria ficar burra _ ela me contou.
Quando comecei a estudar oficialmente, já lia algumas coisas, pois estudava em casa, usando a cartilha de meus irmãos "Caminho suave".
Comecei os estudos numa escola particular: o querido "Instituto Áurea". Foi uma emoção entrar ali. O Hino Nacional e o da Escola eram cantados todas as segundas-feiras no pátio do colégio, onde formávamos. Participava do Desfile Cívico que era marcado pela apresentação da Banda da escola. Todas as datas cívicas eram comemoradas. Não lembro da existência de biblioteca no Áurea. Recebia muitas informações durante as aulas, voltadas para o conteúdo programático. Durante quatro anos estudei ali e fui muito feliz!
Dona Laura foi minha primeira professora. Tenho bem clara em minha memória a figura dela: cerca de uns 65 anos, magra, muito dedicada... Descobri que ela também foi uma das professoras de minha mãe. (D. Laura esteve duas gerações em minha família ensinando-nos e só agora me dei conta disto...)
Eu e minhas irmãs tínhamos o bom hábito de pegar nossos livros de Língua Portuguesa e, deitadas na cama, líamos juntas os textos mais interessantes. Uma era a narradora e as outras faziam as falas, conforme os personagens. Era muito gostoso.
Mamãe tinha alguns livros raros. Entre eles, um autografado pela Cecília Meireles:"Rui Barbosa, pequenas histórias de uma grande vida". Na época, Cecília era diretora da Escola Bahia, onde mamãe estudava . Não sei quem tem mais orgulho disto, se ela ou eu. O primeiro livro que li foi "O sonho de Marina", de Guilherme de Almeida (1944), foi também um dos livros que mamãe recebeu na escola por sua dedicação aos estudos.
Na 5ª série fui para outra escola particular, o Externato Cruzeiro do Sul, porque o Instituto Áurea iria fechar, não sei porquê. Em novo ambiente, consegui boa adaptação e continuava com bom desempenho. Fiz muitos amigos ali, onde cursei as séries finais do Ensino Fundamantal e o Ensino Médio. Fui oradora nas duas formaturas.
No Ensino Médio, duas leituras marcaram: "A mão e a luva" de Machado de Assis, negativamente, porque achei uma leitura pesada e não me envolvi com a história; "Iracema" de José de Alencar, positivamente. Envolvi-me com a narração sobre a índia e me encantei com a riqueza do texto. Outras leituras agradáveis foram: "O cortiço", de Aluísio de Azevedo , "Vidas secas", de Graciliano Ramos, entre outras.
Três professores marcaram minha vida: D. Neli (Artes), D. Lenir (Língua Portuguesa) e o Evangelino (Química)_ com este mantenho contato até hoje.
D. Neli tornou-se coordenadora da Escola e me inspirou a escolher o Curso de Formação de Professores. No 3º ano, convidou-me para estagiar numa turma de pré-escola. Aceitei. Esta foi a primeira vez que entrei em sala de aula para ensinar e encantei-me com a possibilidade de começar um processo de letramento na vida daquelas crianças.
Após terminar a formação, entrei num curso Pré-vestibular com minha irmã caçula. Estudamos muito durante um ano, mas valeu à pena. Passei para Portguês-grego na UFRJ. Ela também foi aprovada (Biologia na FAHUPE).
Na UFRJ, na Faculdade de Letras, fui monitora no Departamento de Grego. Nesta função, tirava dúvidas de alguns colegas universitários sobre o grego, às vezes viajava com professores do departamento e até ministrei uma palestra na "Semana de Estudos Clássicos" sobre "As fábulas de Esopo e Febo". Isso foi muito bom.
Muitas leituras ficaram: "Ilíada" e "A odisséia", de Homero", "Prometeu acorrentado" de Ésquilo, "Os Lusíadas" de Camões, "Antígona" e "Édipo rei" de Sófocles. Os textos épicos são fascinantes.
Optei pela licenciatura plena, que era ministrada na Urca _ na Faculdade de Educação. Ali encontrei uma pessoa que marcou profundamente minha vida _ Maria Luíza, professora de Filosofia. Suas aulas eram fantásticas, surpreendentes. Se não fossem os cabelos grisalhos, diria que tinha dezoito ou no máximo trinta anos. Na verdade, aparentava ter uns 60 anos, mas sua disposição, seu entusiasmo, sua alegria de viver, me envolviam e eu ficava encantada vendo-a em sala. Viajava enquanto Maria Luíza nos ensinava filosofia, filosofando.

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